quinta-feira, 27 de maio de 2010

Value investment: gestores explicam as métricas usadas pela estratégia de Buffett

Por: Julia Ramos M. Leite
27/05/10 - 19h42
InfoMoney


SÃO PAULO – O value investing  tem ninguém menos que Warren Buffett como um de seus mais célebres seguidores. A estratégia – que, de maneira muito simplificada, consiste em investir em ações com foco em seus descontos em relação ao valor intrínseco da companhia – foi discutida por gestores e investidores nesta quarta-feira (26), em São Paulo, no 3º Congresso Value Investing Brasil.

Apesar de defenderem a estratégia, muitos gestores destacaram que, desde os tempos de Buffett, muita coisa mudou. “Todos, é claro, querem seguir o Buffett. Mas será que ele mesmo, se fosse começar de novo, faria tudo de novo? O mundo mudou de lá pra cá”, questionou Mauro Rodrigues da Cunha, da Mauá Sekular Investimentos.

Para Maurício Bittencourt, da M Square Investimentos, uma das principais diferenças é o amplo acesso à informação. “Antes, era possível se diferenciar por ter um histórico de informações completo e atualizado – hoje, isso não acontece mais”, explica.

Avaliações objetivas e subjetivas
Assim, cada gestor tenta se diferenciar focando em algum aspecto além da análise de preços e múltiplos, que são mais objetivas, mas também estão disponíveis para todos. “Value investing é um lugar cheio para se estar – tem muita gente fazendo isso”, afirma Cunha. A opção, então, é partir para as análises mais subjetivas, como análise do negócio, das pessoas e dos riscos.


No caso da M Square Investimentos, o foco principal é na qualidade do negócio e das pessoas – além de estudar extensivamente as empresas nas quais investe e manter um relacionamento próximo com os executivos, a gestora conversa ainda com ex-funcionários e sócios, além de empresas de capital fechado, para se assegurar da qualidade da empresa. “A qualidade do negócio é o melhor aliado do investidor no longo prazo”, explica Bittencourt.
Mario Fleck, da Rio Bravo Investimentos, recomenda uma relação ainda mais próxima com as companhias: estar no conselho das empresas. “Isso nos impede de negociar os papéis nos períodos de silêncio, mas vale a pena”, explica.
Segundo Fleck, um dos aspectos avaliados nas empresas é o sistema de remuneração. “É importante que os executivos tenham ações da empresa, na nossa visão, porque atrela o desempenho deles aos da própria companhia”, afirmou. Ele explica também que, quando um gestor monta uma carteira baseado em value investment, é preciso não só calcular muito bem a estratégia de entrada, mas também a de saída. “É bom pensar em quanto tempo demoraria para liquidar a carteira, e comparar isso com a liquidez que o seu fundo oferece”.
Métricas
O aspecto mais comumente atrelado ao value investing – o preço – não deve ser o único foco na escolha da empresa para investir, de acordo com os gestores. “O preço é muito importante, mas é só uma variável – e não é sinônimo de múltiplos baixos”, explica Bittencourt.


Assim, os gestores explicaram as metodologias usadas – e, mais ainda, as não usadas – para calcular o valor dos papéis. Rebouças, por exemplo, defendeu métodos simples, as “contas de padeiro”. “Fluxo de caixa descontado não usamos nunca, e o fluxo de caixa simples às vezes, só para verificar as contas”, afirmou. “Calcular fluxo de caixa descontado, crescimento em 10 anos, é uma abstração. Dez anos por quê? Só porque se tem dez dedos nas mãos?”, brincou Renato Opice, da Pavarini e Opice Gestão de Ativos.

Bittencourt explicou detalhadamente as análises da M Square. Entre os fatores destacados por ele na avaliação das empresas, estão o baixo risco de perda permanente de capital e posição competitiva relevante, além de uma perspectiva de rentabilidade alta e consistente no longo prazo para as companhias.

Para ele, a análise de múltiplos estáticos, apesar de mais objetiva, pode ser enganosa. “Existe a miopia do múltiplo, porque o preço atual reflete momentum e o crescimento de curto prazo ao invés de crescimento potencial e rentabilidade de longo prazo”, explica.

Já André Gordon, da GTI Administração de Recursos, destacou que nunca é recomendado focar-se em apenas uma metodologia de avaliação. “O valor de reposição é uma boa métrica para se calcular a barreira de entrada. Múltiplos também são úteis, considerados os devidos ajustes de cada um”, afirmou. No longo prazo, a recomendação é foco nas projeções – macro e micro – além do preço dos papéis.

O gestor também comentou a margem de segurança usada para as ações. “Isso depende muito da empresa; uma companhia como Itaú Unibanco (ITUB4) ou AmBev (AMBV4), tem margens menores, porque não há dúvida que ela vá entregar o resultado”, explicou.

O foco, contudo, deve ser sempre nos fundamentos – para os gestores, as perspectivas e o cenário macro podem mudar sem que o investidor necessariamente sofra perdas, mas se os fundamentos da empresa estiverem errados, é quase inevitável.

Mitos
Gordon lembra que value investing não significa um investimento livre de riscos, como às vezes é percebido. “Tem riscos sim, às vezes até maiores do que um growth investing. O que temos que fazer é buscar um retorno compensador por isso”, afirma o gestor. “Nunca deve se desconsiderar um risco de value investment, porque a ação não vai estar barata à toa”, completa.


Já Cunha destaca que o value investing é um meio, não um fim – e não significa investir em small caps.