A capa da nova "The Economist" traz a imagem de um buraco negro. Ao redor dele, planetas e estrelas estão sendo sugados. No centro do buraco, as palavras: "Be afraid" (tenha medo).
Na sexta, o ministro Guido Mantega (Fazenda) evocou a imagem para justificar o movimento do Banco Central no sentido de reduzir os juros no Brasil em momento de inflação em alta.
Isso ajudaria a manter a atividade à tona enquanto o mundo afunda. As pressões inflacionárias seriam contidas por uma "desinflação" global. O planeta comprará e crescerá menos, segurando preços, é a aposta.
No Brasil, o limite do teto da meta de inflação (de 6,5%) está ameaçado neste ano.
Mas o governo opta por arriscar um pouco mais de inflação no curto prazo a ver o crescimento desabar.
Ao mesmo tempo, cortaria os juros para economizar no gasto público.
A dívida pública federal cai R$ 8,6 bilhões (11% do orçamento da Saúde) para cada ponto percentual de queda da Selic , após o período de um ano.
Na semana passada, o presidente do BC, Alexandre Tombini, quantificou no Congresso o quanto esse buraco negro citado pela "The Economist" já sugou: US$ 10 trilhões em riqueza de famílias e empresas em quatro meses de turbulência nas Bolsas.
O Brasil teria mudado sua política, ao cortar o juro, para fugir dessa força gravitacional negativa.
A destruição da riqueza, ancorada na crise das dívidas dos países ricos, é quem alimenta a espiral do buraco negro. Com o passar do tempo, sua força fica irresistível.
Na zona do euro (17 países), mais da metade dos U$ 6,5 trilhões em títulos emitidos pelos governos locais já mostram sinais de deterioração (leia-se risco de calote), segundo o FMI.
Bancos ao redor do mundo, especialmente na Europa, são os principais credores desses papéis.
Do outro lado do Atlântico, os bancos norte-americanos também estão expostos: mais de meio trilhão de dólares em ativos em risco em Grécia, Irlanda, Itália, Portugal e Espanha.
O sistema segue "capturado".
Mesmo que haja um quase improvável socorro trilionário (nos moldes de 2008 e que acabou por arrebentar as contas fiscais nos EUA e na Europa) ele serviria para salvar, em última instância, os próprios bancos.
São eles os principais detentores dessas dívidas.
É preciso levar em conta também que, até 2008, o mundo só crescia porque esses mesmos bancos inundavam famílias e empresas com crédito farto e barato, gerado pela irresponsabilidade que nos trouxe à crise atual.
Ou seja, dificilmente o mundo voltará ao padrão anterior de crescimento. Mesmo que seja adotada solução política que passe por mais gastos estatais trilionários.
*O quadro abaixo tentar dar uma ideia do futuro.
Mostra o potencial de crescimento neste ano e no próximo na comparação com os sete anos que antecederam a crise global.
Editoria de Arte/Folhapress | ||
Fernando Canzian é repórter especial da Folha. Foi secretário de Redação, editor de Brasil e do Painel e correspondente em Washington e Nova York. Ganhou um Prêmio Esso em 2006 e é autor do livro "Desastre Global - Um ano na pior crise desde 1929". Escreve às segundas-feiras na Folha.com.